A PEDRA DO SAAMAKA: ILHA SAGRADA, MEMÓRIA ANCESTRAL E ESPIRITUALIDADE NO RIO OIAPOQUE
A Pedra do Saamaka. Eu já tinha ouvido falar sobre ela, mas, por muito tempo, essa referência permaneceu apenas no meu imaginário, como algo distante — quase uma criação da memória popular. Em diversas conversas, o nome surgia, e eu escutava com curiosidade, mas também com certa dúvida sobre sua real existência.
Os Saamaka entraram para a história como um povo que fugiu da escravidão e construiu sua liberdade dominando territórios difíceis. No rio Oiapoque, tornaram-se exímios canoeiros, aprendendo a navegar entre pedras e corredeiras perigosas, onde poucos ousam passar. Esse domínio das águas não é apenas técnico, mas também espiritual e ancestral.
A Pedra do Saamaka não é apenas uma pedra: trata-se de uma ilha de pedra sagrada, escolhida pelos ancestrais dos povos originários do rio Oiapoque. É reconhecida como um espaço especial, carregado de força espiritual, sendo também local dos Kuruanas, entidades guardiãs que habitam esse território segundo a tradição ancestral.
Localizada nas proximidades da comunidade de Tampack, a Pedra do Saamaka existe, resiste e é profundamente respeitada. Minha visita aconteceu na companhia de descendentes daqueles que consagraram esse lugar ao longo do tempo. Navegadores e pescadores que passam pela região reconhecem sua importância e sabem que ali não se passa sem respeito.
No dia 13 de dezembro, sob chuva intensa e com a navegação ainda mais perigosa, chegamos ao local. Ao desembarcar, uma das mulheres do grupo caiu. Quando se levantou, parecia estar em transe e, em um dialeto incorporado, fez a pergunta que ecoou entre todos: “O que toda essa gente faz aqui?”
Diante daquele momento, os mais velhos e chefes do grupo realizaram um ritual, pedindo permissão e proteção. Era o reconhecimento de que aquele espaço não é apenas físico, mas espiritual — um território ancestral escolhido, guardado e respeitado pelos povos do rio.
Foi assim que conheci a Pedra do Saamaka, no rio Oiapoque: uma ilha de pedra sagrada, lugar dos Kuruanas, símbolo vivo de memória, espiritualidade e resistência ancestral.
Qual é a sua reação?
João Ataide
João Ataide, reporte e administrador do Portal O Viajante.
